sábado, 25 de novembro de 2017

96. MEMÓRIAS DO ALTO MAR



Um domingo FISH
 
FISH, mesmo

 Fish, mesmo

No sábado, fomos surpreendidos por um convite do Forte, no sentido de embarcarmos para fazer uma pesquinha no domingo (19 de Novembro). Questionada a família, por causa de hábitos arreigados de almoçaradas e passeatas conjuntas neste dia da semana (é agradável este cerimonial de conveniências com vinhos rosé, sobremesas de gelado e salsichas grelhadas), foram autorizados o Borges, o Cheta e obviamente o Forte, a apresentarem-se na Marina às 07h00. Ainda se acrescentou o Américo, um ocasional no preenchimento de impossibilidades, caso do Malheiro (foi à caça do javali) e do Óscar (a gerir o Restaurante).
Refira -se, por uma questão de respeito e consideração, que nas minhas 71 saídas à pesca no Fosmar, pela primeira vez, o nosso amigo e companheiro Óscar, não pôde capitanear a embarcação. Nem quero pensar na tristeza e na agonia dele…Mas, a vida é assim, vestida de momentos bons e momentos menos bons. A todos acontece passarem por altos e baixos, no percurso desta nossa breve existência. Lamentámos a sua ausência.

Condições

 Forte, é sempre o melhor

É habitual dizer -se que “Nada podemos fazer para mudar o tempo, mas podemos utilizar bem o tempo”. Assim fizemos, atendendo que as condições do estado do mar, claro que na dependência da meteorologia geral, se apresentavam óptimas, sobretudo porque nesta altura do ano (está aí o Inverno), são raras. Mar sereno, vento afável, temperatura meiga, propensão dos peixes, enfim, só excepcionalidades. Na certeza do bem-estar, o colosso de força e mistério (o mar), como que nos levou ao colo para lá e para cá, feito mãezinha amorosa.

 Cheta, faltou a massa

Assim sendo, utilizámos muito bem os nossos tempos, pois a pesca deu variedade, qualidade, intensidade e quantidade. Acresce, deve dizer-se, e desculpem a minha vaidade (vai directa para o zelo da minha esposa), o requinte gastronómico do almoço, que foi histórico. Querem saber? Foram sandes de pá assada no forno. O Cheta ainda falou numa massinha a acompanhar, mas o ditame da maioria, fez reverter a ideia. Soube bem, não se perdeu tempo, não se sujou louça, não se atravancou o convés. 

Fanecas, peixe amarelo

Quando a necessidade faz costume, mudam-se hábitos, ou pelo menos fica a ideia de os poder alterar.

Referências, mas pequenas

 Américo. A cerveja?

Guardo sempre para o fim referir os factos menos relevantes. Foram eles:
- O Forte desta vez e por estranho que pareça, não quebrou a cana. Começa a perceber como se manuseia uma cana!
- O Cheta não molhou as sapatilhas e por conseguinte os pezinhos. Já se constipou por menos.
- O Borges estreou um boné novo meio abichanado. Alguém reparou?

 Borges: um boné abichanado?

- O Américo disse que estava proibido pelo médico de beber álcool. Lixou as cervejas todas.
- O barco limpou-se em meia hora, não ficando sequer uma cagadela de mosca, a estragar o serviço. Ainda não houve inspecção.
Enfim, foi um domingo totalmente FISH, exceptuando a ausência do Óscar, bem como a do Malheiro. Numa equipa todos fazem falta.

O Óscar e a sua ausência

Marina de Leça,  19 de Novembro de 2017
Luís M. Borges

terça-feira, 14 de novembro de 2017

95. MEMÓRIAS DO ALTO MAR

Um limite entre nós...

 Forte

O frio não se esconde
O vento não se guarda
O sol não se atrasa
A lua não se entende


Malheiro

Onde caiu este dia de pesca, que não me apeteceu pescar? Porquê? 

Cheta

Borges

Ao largo de Leixões, 13 de Novembro de 2017
Luís M. Borges

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

94. MEMÓRIAS DO ALTO MAR

GORAZ RECORDE

Engº Emílio, com Goraz de 6,1 kg

1.Incredulidade

Quando peixes excepcionais são capturados, surgem sempre, atitudes naturais de incredulidade:
- Não acredito!
Mas, perante as evidências (imagens, peso e comprimento comprovados), alteram-se atitudes:
- Que peixe fabuloso. Parabéns Engº Emílio. Como foi?

Foi, que no dia 14 de Outubro de 2017, o Engº Emílio dos Santos Pereira, capturou ao largo do Porto de Leixões, na sua embarcação Coral, um extraordinário GORAZ, com o peso de 6,100 Kgm e o comprimento total de 70,5 cm.

Deu que falar este goraz, um exemplo de longevidade desta espécie. É que se a um goraz de 4 kg corresponde a bonita idade de 20 anos (de acordo com referências do Website Fish Base), este goraz de 6,100 kg, terá 30 anos. É claro, que a matemática vale o que vale (um jovem de 20 anos e 1,90 m de altura, pode pesar 100 kg). Para se ter a certeza da idade deste goraz, só um biólogo o poderia fazer. Assim, o Engº Emílio solicitou a Mike Weber, responsável da "Estação Litoral da Aguda" (um parque zoológico português, propriedade da Câmara Municipal de Gaia, localizado na Praia da Aguda, Arcozelo), que analisasse o fenómeno e tirasse as dúvidas.

 Comprimento: 70,5 cm

2. Pormenores da captura

A primeira sensação do Engº Emílio foi de que o peixe lhe tinha fugido, pois tinha arrancado e levado uns 30 metros de fio, desengatando-se.
Contudo, o peixe insistiu e acabou por ficar preso.
Durante 15 minutos a luta prometeu, tendo-se até enleado noutra linha, pois começou a nadar para trás, a favor da corrente. A mestria do Eng.º Emílio fez o resto, tendo o xalavar salvaguardado o peixe.


 Peso: 6,100 Kg



 Registo da balança

Testemunhas: à esquerda José Manuel B. M. Rodrigues; à direita Moacir S. Leite

3. Alguns registos

- Nome comum: Goraz
- Nome científico: Pagellus bogaraveo
- Comprimento X (65 cm) e comprimento XX (70,5 cm)
- Perímetro Y (56 cm)
- Data da captura: 14 de Outubro de 2017 ao largo de Leixões
- Técnica de captura: pesca de fundo, à linha com cana "Playway Sea Bream", carreto manual e multifilamento "Braid 8B Daiwa", com uma resistência de 36 kg.

Para que esta magnífica captura invulgar possa registada através de notícia, o Jornal Notícias do Mar, irá publicar este feito de nível nacional e também europeu.

4. Pescadores com boca

Acerca do Goraz: Saberes e sabores

Foi no Restaurante D. Lurdes, na Maia, que este grandalhão (que tinha sido congelado), satisfez 9 pescadores com boca. Grande noite, plena de histórias, recados, piadas e sabores.
Vale a pena ser pescador...

PARABÉNS ENGº EMÍLIO

Marina de Leça, 28 de Outubro de 2017
Luís M. Borges








quinta-feira, 12 de outubro de 2017

93. Memórias do alto mar



ARRAIAL DE CARAPAUS

1.Lamento

Desde o dia 29 de Julho que não pisava o mar. Sinceramente, já tinha esquecido a gíria e alguns procedimentos, bem como perdido a habitual normalidade física dos pequenos gestos.
Lá em casa, a arca frigorífica só mostrava espaços vazios, sem peixes à vista. O Cheta lamentava-se do mesmo.

 Agulha (1,958 kg)

Os amigos, já olhavam com desconfiança para mim, pois há muito que não me viam de colete de pesca e de boné. Achavam-me triste. Houve até um deles que me perguntou se tinha perdido o mar e as canas. Quando telefonava ao Óscar e ao Forte, só lhes perguntava pela saúde, embora o meu desejo traísse as palavras.

2.Que Outono? 
O dia começou deste modo 

No sábado o Óscar falou. E disse:
- Segunda às 06h00 na Marina.
Pelo caminho fui pensando nas circunstâncias do clima em Portugal deste Outono. Com uma seca anormal e temperaturas altas impensáveis, receava pelo êxito da pesca. Os rios sem caudais, falta de aluviões, peixes sem alimento, debandada destes para outras paragens. Seria assim? Contudo, colocava-se outra hipótese. Acontecer o contrário: os peixes ficarem nos seus sítios habituais e esfomeados, atacarem com voracidade os iscos, que lhes íamos apresentando. A terceira teoria, seria o surgir de espécies fora do habitual a ocuparem os lugares vazios, dada a mudança de condições marinhas. Enfim…

3. Os carapaus casaram com as bogas

O que se verificou foi uma espécie de mercado de carapaus e bogas. Atolavam o mar e atolaram os cabazes, embora as bogas tenham sido todas rejeitadas para delícia dos mascatos (As gaivotas bem tentavam pegá-las, mas não tinham boca nem pescoço para as engolirem, largando-as. Logo se aproveitavam os mascatos em voo picado rápido e certeiro. Fantásticos mascatos...).
Nesta avalanche contínua, de vez em quando, um sargo ou uma choupa quebravam a metralha carapauzeira e bogueira. 

 Cabaz de carapaus

Depressa se encheram as caixas, depressa acabou o isco, depressa a satisfação abriu sorrisos e depressa se deu a ordem de regresso. Eram 15h30.
Com o mar liso,  o ar sereno, a temperatura cálida e boa disposição pessoal, chegámos de t-shirt à Marina.
No ancoradouro, os mesmos colegas de sempre, a perguntarem, a quererem ver. Atitudes saudáveis!

4. Excepções


O pargo do Óscar

Mas, nesta pescaria singular, onde o carapau foi rei e a boga rainha indesejável, houve lugar a excepções.  Dos quatro pescadores 3 pontuaram, menos eu. Passaram à fase final do campeonato o Óscar com dois pargos, o Cheta com outro e o Malheiro com um congro de 10 kg.

O congro do Malheiro

Dizia o Óscar com ironia sobre o congro:
- É uma porca!

4.1. Sargo pescado vira isco
O congro adora fanecas

O Malheiro decidiu amanhar o seu enorme congro no barco. Querem saber o que este malvado tinha no estômago? Um sargo de para aí uns 400 gr, com um estralho de nylon a sair-lhe pela boca. Pressupôs-se, que um de nós tenha ferrado este sargo e o congro, que rondava por ali à caça, ao detectar que ele estava a debater-se e preso ao anzol e portanto à sua mercê, abocanhou-o imediatamente. Cá em cima no barco, algum de nós sentiu de certeza um forte puxão, ficando de seguida sem o estralho. 
Sabe-se, que o congro aprecia faneca, mas desta vez a este apeteceu-lhe um sargo.

5. Mascatos humanos

Termino com a dose dupla de cabrito e de vitela vindas do restaurante “O Grelhador” pelo Óscar. Nada sobrou. A fome tinha atingido naturalmente os pescadores, pois houve atraso, por causa da freguesia de carapaus…
- Está a dar,  está a dar. Quando parar…comeremos.

 Cabrito assado

Como recordação associada ao nosso almoço, relembro o mascato a engolir com sofreguidão as irritantes amantes do carapau, tal como todos nós a engolirmos o almoço. Parecíamos mascatos. Pela goela abaixo o cabrito (estava uma delícia) quase sem mastigar….kkkkkkkk

6. Distribuição 

No dia seguinte, na minha rua, ao almoço,  só cheirava a carapau assado. Dei praticamente todos os carapaus aos vizinhos e eles decidiram grelhá-los. A minha esposa fez o mesmo. Tanto carapau merecia distribuição. 

 Tanto carapau...

Os três ou quatro sargos que me calharam, marcharam para o forno, na quarta-feira.
Que dia de pesca do “Cara…lho”. Desculpem, do “Cara...pau”.

Senhora da Hora, 09 de Outubro de 2017
Luís M. Borges





92. Memórias da Ilha 2017

ILHA DO FAROL 2017 


1.Há algo no exterior dos peixes
 
Há algo no exterior dos peixes que faz bem ao interior dos seres humanos. Sinto esta verdade simples quando pesco na Ilha do Farol. Não sei explicar. O certo é que pescar “viúvas” dá para empolgar; também pescar uns pequenos “picas-del-rei” provoca imenso prazer; sacar um robalo, uma anchova ou até uma dourada, traz vibração.

Pica-del-rei

Enquanto viajava no Alfa Porto – Faro fui-me descontraindo. E sorria. E sonhava.
Cheguei a Olhão por volta do meio-dia, já liberto de cenas imaginárias e a pensar no horário do Barco da Carreira, que me levaria até à ilha do Farol.

A Ilha do Farol

Apita o combóio, traçando Portugal do Porto a Olhão. Muito turista realmente. Senti que este País já não é dos portugueses. Viagem confortável, sossegada, apenas construída pela vergonha dos WC sem água e consequentemente por merda e mijo em abundância. Neste sentido, julguei-me de novo, mas na Mauritânia…lá onde a merda no aeroporto de Tumbuktu fazia monte na única cagadeira existente.

Turistas

Almocei umas sardinhas e sosseguei as vistas no barco até à ilha. Ah…aquela rapariga debruçada, perna ao léu, fez-me esquecer a magnificência da paisagem.
Cheguei a casa sozinho e descartei a bagagem: roupas para um lado, material de pesca para outro. Depois fui até à Associação ver o FCP e aproveitar para descascar uns amendoins com a frescura duma pretinha.
Finalizei este dia em amena cavaqueira pescal, na confissão dos fracassos e dos êxitos.

2. Cem poemas de Sophia 

Outra versão: Embarcado, fixei o horizonte. Lembrei-me da grande poetisa Sophia e do seu Poema, perante a exuberância natural da Ria Formosa.
(…) A terra o sol o vento o mar
São minha biografia e são meu rosto (…)

A praia do Farol

Mas, mais referiu a poetisa: que a sua vida era o mar, o seu interior uma atenção voltada para fora, o seu viver escutava; que não trazia Deus consigo mas no mundo o procurava sabendo que o real o mostraria; que não tinha explicações, olhava e confrontava.
Apropriando as frases de Sophia, eu também confrontava enquanto navegava nas águas da ria, o seu sol acolhedor, a brisa do sul e a ilha com o seu farol, apontando ao Céu.

3. Eu pescador me confesso 

Dormi bem, acordei no silêncio. O meu corpo e o meu espírito sentiam a influência da Ilha. Às 07h15, o nosso dinâmico corredor de fundo, mais conhecido por Dr Adérito, já se afanava com as canas na cozinha, enquanto tomava o pequeno-almoço. Saímos para a pesca 15 minutos depois.
O Adérito pescou apenas 3 robalotes, demorando-se para além do horário, que esta espécie de peixes impõe aos pescadores. O que não iria acontecer com as anchovas à hora do almoço,
pois elas entraram na ria trazendo as aves, enquanto almoçávamos os três descontraidamente, elogiando o arroz de peixe.

Bailas e robalos

Com a partida da Dra Eugénia, esposa do Adérito, levantou-se forte ventania, que impossibilitou a minha pesca às “viúvas” na Somec.
Decididamente, neste 1º dia de pesca, os planetas não se alinharam.
No dia seguinte, 19 de Setembro, foi uma manhã à olhanense. A buscar coisas úteis nas bancas do mercado e nas prateleiras do Pingo Doce. Sabem, aquelas coisas que consideramos necessárias e úteis, as quais encheram o carrinho: azeitonas, tremoços, amendoins, vinho, legumes, fruta, pão, sardinhas – a alimentação frugal num relance! A ilha deixa-nos viver mas com limitações.
Entretanto o Adérito, neste jogo a dois (eu em Olhão e ele no Molhe da Ilha), enganou 16 pintarolas (aquela espécie de robalo com pintas – a baila), no amanhecer do molhe, lógico. E mais, pois quando eu cheguei pelas 12h00 tinha ido de novo a ver das anchovas perdidas do dia anterior. O regresso ao passado é muito lindo, mas em filme…embora ainda tenha capturado só uma. Eu, também me vinguei do fracasso antecedente, ao tirar a terreiro uma boas viúvas.

Anchovas à algarvia

Informação importante: no mercado de peixe de Olhão comprei um quilo de biqueirões granjolas, lindos de comer. Foram os protagonistas do nosso almoço, preparados à moda algarvia. Delícia!
A receita é simples: amanhá-los e temperá-los com sal, limão e alho, durante uma hora ou mais e depois passá-los por ovo batido, farinha e fritá-los.



4. Os vazios ocupam um espaço imenso 

Seis sargos de bom tamanho, durante a manhã de quarta-feira, entre as 06h00 e as 09h30, deram-nos os bons dias no 76. Pescado ao fundo com uma chumbeira de 60 gr e camarão descongelado como isco. Foi o nosso jantar deste dia 20 de Setembro. Ambos gostamos de peixe cozido ao vapor, juntamente com bróculo, cenoura e couve-flor, com um molho Receita Poveira.

O Sr Pinto

O peixe deixou de picar justamente às 09h30, quando a vazante virou paragem. Radicalmente. Disso se queixaram o sr Pinto na sua cadeira de rodas e a D. Alice nas pedras. Acabaram por nos dar simpatia, pois também eles foram umas vítimas do vazio que se instalou.
O resto do dia passou-se no remanso.

A D. Rosa

5. Senhora anchova, porque lhe apropriaram o nome? * 

Fizemos neste dia a festa da anchova. Grelhada, com salada de feijão verde, cebola e tomate. Deu para bater ao de levezinho na barriga. Mas, antes, no amanhecer da horinha, o número mágico (76) tinha dado mais umas boas peças (4), por entre o bulício das taínhas a serem perseguidas por enormes corvinas. Impressionante! Notaram/se as douradas, pois desferravam com violência. Concluí mais tarde, que o anzol nº 4 que utilizava, era demasiado pequeno para a boca das douradas. Não pesquei uma! E para cúmulo do azar acabou-se-me o isco. O Adérito foi para a ponta do molhe onde desalinhou a vida de 4 bailas.

Dourada

Este dia de bela vida acabou com um telefonema à minha esposa…Como diria o Fernando Pessoa (outra vez): sou “Casado, fútil, quotidiano…”.
* Existem para aí umas latinhas de conserva de biqueirão. Por que raio lhe chamam “Anchovas”?.

6. “Dêem-me o céu azul e o sol visível…” 

A reler Álvaro de Campos às 04h00. Tenho destes hábitos.
Mas, se houve céu azul e sol visível, os peixes não mostraram a cor nem se mostraram nos anzóis. Só o Adérito mereceu a tristeza dos seus colegas de corrico, pois deixou escapar uma anchova para aí de 5 quilos (segundo eles). Ainda se aborreceu com um palermóide, a que apelidam de francês, por causa da cedência de um camaroeiro.

 Tá o mar fête num cão

Valeu ao almoço uma massada de peixe e à noite uma sopa do mesmo. A digestão fez-se na Associação com o FCP a derrotar o Moreirense.
Mas pesava ao Adérito a perda da referida anchova matulona. Lamentava-se que a culpa foi do nó de ligação do nylon ao multifilamento. Afinal, o céu escureceu e o sol tapou. Alguém gritou para a companheira:
- Oh Maria, estás a ver? Deixa lá, a pesca é assim!

7. Dia de Olhão, Feira, Mercado e Pingo Doce
 
Desrotinar a pesca e verificar a banalidade sentada, calada e absorta em nada, dos passageiros do barco da carreira. E mais, verificar carrinhos, todos com carrinhos e na cabeça a lista de comprasa, certamente.
Sinto simpatia pelas vendedeiras da Feira e do Mercado. Vendem o coração, vendem sempre autêntico e do melhor, vendem sorrisos e legumes…vendem palavras.
Já no Pingo Doce não é assim. Há empregadas. São “colaboradoras” do patrão, defendendo a sua gula financeira. Mas ná variedade de produtos, há promoções, tudo é nacional sempre dentro do prazo de validade e com rótulo de composição (obviamente, por respeito à humanidade). Importa é encher o carrinho e pagar na caixa.

 Mestre Sabino

Nós comprámos o essencial e o acessório. Neste ultimo, até os “tapa-mamilos” e um frango assado. Carregados, demos passagem à marabunta de turistas que demandavam a Ilha, quando embarcámos para o regresso. Disseram-me os locais que os turístas tinham descoberto Olhão e a Ilha do Farol (afinal os descobrimentos não acabaram, mas agora ao contrário). Eles irão colonizar e os olhanenses vão se foder!

 Adérito Alves

Já chegados, e como não podia deixar de ser, fomos pescar. Adérito no molhe e eu no Cais da Somec. Qual quê? Sossego não existia, espaço para pescar não existia, cacofonia existia, barcos a navegar também e até mergulhadores em iniciação. Nesta conjuntura a sociedade escamosa pisgou-se, sobretudo as classes mais desejadas. Capturei meia dúzia de agulhas, outro tanto de “viúvas” e tive de suportar o infantário das irritantes e ladrazinhas de iscos, choupinhas de 10 cm. Foi tudo remetido à água.
Só deu para apanhar um solinho, para bronzear mais um pouco.

8. Dia 24 de Setembro, domingo

Apeteceu-me ir à praia, mas começando a ver aquelas turistas gordas e feias, deixou de me apetecer; lembrei-me de ir pescar, mas olhando a concentração de seres humanos no molhe, do género corricadores, deixou logo de me apetecer; tinha de ir ao café da Associação ler os Emails e tomar um cafezinho, também não me apeteceu por falta de vontade; apeteceu-me não fazer nada!. Pronto. Consegui.

 Eng- Trigueiros

Entretanto, o mar começou com a barulheira. As ondas batiam na areia com estrondo. Estava a avisar que viria aí um sudoeste. É todos os anos assim. Na última semana de Setembro, o mar zanga-se connosco. Mas, como diz o cego ao cão: - Vamos ver! Se haverá ou não sudoeste.
Por volta das 17h00 pegámos nas “armas” e nas “munições” e molhe connosco. O Adérito queria anchovas e as aves prometiam, mas depressa passou o entusiasmo aos robalos de pingalim. Ainda conseguiu três.

 Pingalim 

Quanto a mim, espectador atento, sentei-me numa cadeira branca a acumular sol na pele, a ver os lançamentos. Antes que o escaldão acontecesse, levantei-me e dirigi-me para a ponta do molhe. À bóia, dei com os esquivos dos sargos. Foi meio balde deles. O Adérito chegou, viu e gostou, imitou e bem assim logo acabou enchendo o balde.

 Luís Borges

A anoitecer, o frio obrigou-nos a fazer o caminho de regresso, porque com tshirt só com o Pai Sol.
Resumindo: numa horita fizemos o que S.Pedro nos mandava – pescar.

9. Os grilos da Ilha 

A insónia obriga-me a ler. Comecei a meio da noite com a revista “SPORT, a vida é o melhor desporto”, por indicação do Adérito, que corre como se fugisse do diabo. Diz que gosta e lhe faz bem. Controla tudo ao milímetro com o relógio, a net, a alimentação, o sono, as sapatilhas, etc. Admiro este meu amigo. O texto que li versava Nutrição. Nada que me fosse estranho, embora as indicações se orientassem para a corrida. Não sou adepto, pois acho que é um esforço anti-natural. As minhas corridas são as de andar o mais que puder e de correr o menos possível, evitando prejudicar o equilíbrio, dada a idade. Tenho-me dado bem.
Depois reli os meus “deveres”, ou seja, os meus escritos tipo crónica sobre a Ilha, pegando por último no Álvaro de Campos.
E levantei-me. Sabia que o despertador iria tocar e levantei-me. Porque sabia? Não sei.
Às 05h30 os grilos da Ilha ouviram-nos sair para a pesca e calaram-se.
No regresso do molhe mágico o Adérito não corria, pois os 12 robalos na saca pesavam e eu tal e qual, com 10 sargos crescidinhos, que acreditavam poder chegar a velhos. Julgo eu!

 Sargos

Neste contexto, o céu parecia-nos maior, o mar mais azul e a vida mais leve e agradável. Até que nem era preciso aperceber-nos desta realidade aumentada: o esplendor deste Verão continuado tinha outra expressão na Ilha, quase uma pintura. Os seres humanos que lá vivem nem se apercebem desta maravilha e se se apercebem não sabem tornar-se contentes e felizes.

10º Dia, 26 de Setembro, 3ª feira 

WIFI – 063 549 28
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O WIFI foi instalado na casa. Agora, com esta melhoria técnica, já temos a possibilidade de nos ligarmos ao mundo. Dizem.
Desliguei e pela 1ª vez fui mesmo à praia. Revi aquela praia longa, o mar em remanso contínuo e o sol desejado. Deliciei-me a contemplar:
- “Milady, é um perigo contemplá-la…”. Especifiquemos: montes de turistas louras e de olhos azuis a bronzearem os seus bem torneados corpos.

 Cavacos

Apanham-se na Ilha os célebres “Cavacos”, um marisco semelhante na forma à lagosta, mas mais pequenos. Comprámos um quilo. Comemos uns quantos vendo o jogo FC Porto / Mónaco e bebemos 3 cervejas a festejar e a acompanhar. Os príncipes de Mónaco não comeram nem beberam nada – 0.
Antes deste enorme sacrifício, ainda demos um saltinho nos sítios devidos e a coisa acabou por sair empatada: Adérito – 4 robalos / Borges – 4 sargos.

11. “Z-CLAN” E “PATCHINCO”

Duas amostras tipo “Ronaldo”. O Adérito venera estes pequenos objectos brilhantes e perigosos para os peixes.
Foi o dia em que se ouviu o frio a falar. Saí de manhãzinha de calções e regressei enregelado e sem peixe. Inquietude em absoluta no céu nublado, no vento sibilante, nos peixes ausentes, na desilusão dos pescadores e dos turistas.

 Patchinco

À tardinha, o Adérito ainda insistiu na procura das esmeraldas perdidas, aqueles robalos e aquelas anchovas, a pensar na eficácia das suas amostras. Só pescou nada e como diria o Cheta: - Nada é nada. Patchinco…

12. Robalão 

No Norte, certamente, as nossa esposas já sentiam saudades nossas. Os lugares lá de casa desocupados estão vazios e as nossas presenças são como filmes mudos.
Pensámos em levar-lhes umas prendas: pão alentejano (do autêntico), figos secos (pingo de mel) e talvez uns rábanos. Não sabem o que são rábanos?

 O robalão 

Finalmente. O Adérito ganhou em toda a linha no molhe, pescando um robalo com 2,620 kg e 62 cm de comprimento. Não se ficou por aqui, pois ainda logrou capturar uma enorme Agulha com 1 metro de comprimento.
Foi com parabéns, que o Adérito assumiu o mérito pessoal, posando para o fotógrafo de serviço. Dois peixes exemplares, capturados pela amostra denominada “A assassina”.

 A assassina

13º Dia, com “Mar de fora” 

Último dia de pesca na Ilha, ape nas durante a manhã. Vararem no molhe, virados para a Ria, os corricadores confiavam. E quem pescou o maior peixe da manhã? Não adivinham? Eu digo: o Adérito, com uma Anchova de quase um quilo.

 Anchova

Com a anchova pendurada, o “mar de fora” negava-se a acreditar. Com este tipo de mar, os peixes caem fora.
Toda a tarde e noite (até às 24h00) nós dois só fizemos malas e entubámos canas…Acabara-se a cena anual de férias na Ilha do Farol, naquele contexto de lazer total. As saudades de 2018 já se faziam ouvir.

 Avental improvisado

14º Dia, 30 de Setembro, sábado

Regresso. Primeiro de Táxi Marítimo da Ilha a Olhão. Segundo comprara o almoço – frango assado e camarão do Prata. Terceira comprar as tais prendas para as esposas. Quarto comprar para nós umas coisitas: maçãs Casa Nova e Bravo de Esmolfe, romãs e Folares algarvios. Quinto no rumo para o Porto de carro com almoço em Grândola. Sexto, acertar contas (53,00 euros – gasóleo) mais 43,20 (portagem), portanto 96,20 euros no total, dividido por ambos.
Aquele abraço.

 A poesia da Ilha

Matosinhos, 01 de Outubro de 2017
Luís M. Borges